Roma (NEV), 30 de setembro de 2024 – Os médicos que realizam abortos, para o Papa Francisco, são “assassinos”.
O Papa contra o aborto: ‘Os médicos que o praticam são assassinos de aluguel’ – Notícias – Ansa.it
Perguntamos à pastora Ilenya Goss – Coordenador da Comissão para problemas éticos colocados pela ciência das igrejas batista, metodista e valdense – para responder algumas questões sobre o tema. Goss possui três diplomas, em medicina, filosofia e teologia.
Desde 1978, ano da aprovação da lei 194, parece haver um retrocesso. O que mudou desde então, tendo em conta que foi também o eleitorado católico que permitiu chegar a esta norma?
De 1978 até hoje, a Lei 194 foi contestada diversas vezes por associações denominadas “pró-vida” e também pelo magistério da Igreja Católica, por vezes denunciando-a abertamente, mas nem sempre. A lei que regulamenta a interrupção voluntária da gravidez, “Regulamentos para a protecção social da maternidade e sobre a interrupção voluntária da gravidez” passou no seu processo parlamentar com amplo apoio, demonstrando que o país estava pronto para abordar uma questão relevante que fosse pelo menos dois pontos de visão: a de proteger a saúde das mulheres que interrompem a gravidez e a de garantir o direito das mulheres de fazerem escolhas que tenham um forte impacto na sua vida pessoal, emocional, física e psicológica. Hoje o clima social, cultural e político no mundo e na Itália faz-nos perceber a fragilidade das aquisições que acreditávamos serem estáveis. A tendência das interrupções voluntárias da gravidez é uma diminuição desde 1983 até hoje, demonstrando que aqueles que temem uma utilização demasiado ampla da Lei não têm em conta nem os dados nem as dificuldades objectivas encontradas na sua aplicação. As mulheres sempre fizeram abortos ao longo da história, de forma clandestina e em condições de saúde precárias ou péssimas, encontrando infecções, danos permanentes à fertilidade ou morte, como de facto aconteceu em Itália antes de 1978 e ainda acontece em países onde não é possível ter cuidados de saúde para prossiga. Imaginar que podemos voltar a esse tipo de cenário é, no mínimo, irresponsável, se não quisermos usar termos mais sérios.
As declarações do Papa Francisco (como as sobre a “bicha”, esta sobre os médicos “assassinos”, além do seu recente discurso sobre o papel da mulher na Universidade Católica de Louvain, seguido de duras críticas tanto do corpo docente como dos estudantes) Na sua opinião, refletem uma espécie de fragilidade misógina no topo do patriarcado religioso? A forma ainda é substância?
Falando do uso de termos, na resposta anterior tentei usar uma linguagem consciente, porém as declarações do Pontífice nem sempre parecem levar devidamente em conta o efeito mediático das palavras. Pessoalmente não creio que seja apenas um uso descuidado da comunicação, mas sim a emergência de um pensamento. Os protestos após o discurso do Papa Francisco na Universidade Católica Belga destacam a abordagem extremamente conservadora, restritiva e opressiva às mulheres que emerge das referências aos clássicos papéis de género que o Pontífice atribui às mulheres. A utilização do termo “assassinos” para se referir aos médicos que aplicam a lei italiana sobre a interrupção voluntária da gravidez tem uma conotação bastante grave, e não é difícil compreender que com esse tipo de acusação se pretendia reiterar teses conhecidas, o que infelizmente se traduz na afirmação de que uma mulher deve ser forçada a levar uma gravidez até ao fim, mesmo quando não o quer.
Na sua opinião, é possível suspender o julgamento dos outros e concentrar-se primeiro numa compreensão mais profunda de si mesmo e das suas crenças?
Em vez de suspender o julgamento, penso que se trata de compreender seriamente que os seres humanos vivem existências complexas, por vezes situações dramáticas, e que muitas vezes são as mulheres que pagam o preço mais alto pelas distorções e pela violência cultural e religiosa presentes em muitas realidades. Lançar acusações que se assemelham a insultos não parece ajudar-nos a encontrar soluções em conjunto, nem parece corresponder a uma mensagem que nos chama a acompanhar as situações mais dolorosas, a envolver-nos e por vezes a aceitar fazer algo que não é bom em absoluto. sentido, mas é o menos prejudicial possível naquele momento naquele contexto.
Como equilibrar a defesa da liberdade de expressão com a protecção dos direitos religiosos, considerando, por exemplo, as tentativas de codificar a blasfémia como um crime internacional? Será possível encontrar um equilíbrio entre a defesa da liberdade de expressão e a protecção dos direitos religiosos, sem cair num impasse ou numa restrição dos direitos civis?
Penso que a velha lição liberal ainda nos pode ajudar na gestão da questão social, cultural e política do exercício dos direitos e das liberdades: que a liberdade de expressão seja garantida é uma aquisição indispensável que não me parece estar em conflito com o direito ao respeito pelas religiões. Há uma diferença entre expressar um pensamento, incluindo a desaprovação de algo, e insultar: o fundamental é que todos os atores em cena apliquem as regras. O respeito é dever de quem fala e direito de quem ouve, assim como o direito de expressão de quem fala é o dever de permitir que quem ouve se expresse. São as agressões verbais, os insultos, as difamações que não fazem parte de uma forma de viver e de se relacionar que gostaria de ver no mundo que deixamos às gerações futuras, e parece-me que há muito a fazer neste sentido. .
O pastor e teólogo também falou sobre os médicos “assassinos” no Facebook Fúlvio Ferrario.
A declaração da Federação Nacional das Ordens de Cirurgiões e Dentistas: Aborto, Anéis (FNOMCeO): “Os médicos que estão próximos das pessoas permitem aplicar a lei respeitando a liberdade de todos”. – FNOMCeO